domingo, 8 de maio de 2016

Feliz Dia das Mães


Então eles começam a falar. Depois de tanta ansiedade, de achar que os má, bá, pá eram mamãe e de já fazer dois meses que ele falava papai, carro, água, sai aquele mamãe inteiro, perfeito. Lágrimas nos olhos, a gente não tem ideia das delícias que vêm pela frente. Nosso pequeno Nino falou tarde. Falava pouco ainda quando pronunciou um sonoro "abacate". Com todas as letras. "Quer abacate, filho?" E ele repetia: "Abacate!". Que lindo! Ele quer abacate. Tinha na geladeira. Vai abacate para o cadeirão. Careta para o abacate. "Não quer, filho?" Resposta: "Abacate!" "Quer brincar?" "Abacate!" "Cadê a bolsa?" "Abacate!" Aponto a vovó. "Quem é essa?" "Abacate." Palavra boa de se dizer, abacate. E outras vieram que designavam tudo neste mundo: chon, chimina, sapudo. Nosso Pedro nos brindava com pérolas de sílabas trocadas: panta (tampa), santavia (fantasia), pentespade (tempestade). Ensinávamos a palavra certa, assim bem despretensiosamente, com medo de não ouvir mais tais delicias. Mas foram muitas, são muitas. 

E, quando chega os três anos, mais ou menos, a palavra que mais se fala é mesmo NÃO. "Vamos escovar os dentes?" "Não". "Precisa, filho, pro bichinho não comer seu dente." "Não." "O seu dente vai doer." "Não." "Vai ter de tomar injeção." "Não." "O Dick e o Hack." "Não"." "Livros de histórias em cima da torneira". "Não." Desenhos no espelho. "Não, não e não!" Gravata neles, gritos, choro e pontapés. Depois da escovação, ia eu pro quarto. Era a minha vez de chorar. 

Será que precisa ser assim? Você planejou que ia ser tudo na base da conversa, da brincadeira, sem alterar a voz, palmada nem pensar, e o fato é que você começa a entender direitinho o momento exato em que a mão vai esquentando com vontade de sapecar aquele bumbum, cujo dono não quer fazer nada do que você pede. Respire fundo, Denise, respire porque já passamos da era das palmadas. Mas a verdade é que você só entende as surras que levou depois de ter filho. E passa a amar ainda mais a sua mãe. Essa criatura que hoje sorri docemente vendo você contar até três, e só fala: "Tadinho dele." Tô doida pra ser avó! 

No encontro de mães promovido pela Revista CRESCER, perguntaram o que eu achava mais chato de "ser mãe". E eu, prontamente: "Educar!" Mas eles pedem os tais limites. Uma terapeuta amiga falou: "Denise, eles querem saber se a mãe é forte o suficiente para protegê-los e, inconscientemente, pedem essa demonstração de força."

Tudo bem. Vou por aqui, dentro do meu limite em dar limite. Tentando contar até dez, vinte, mil. Comprando todos os títulos da livraria que sugiram a melhor maneira de educar. Segurando a mão, baixando o tom da voz, pronta para sair dez decibéis acima. Inventando histórias de micróbios sobreviventes, vitaminas esquecidas chorando no prato, frutas tristes porque nunca são escolhidas. Lutando contra o relógio, que passa tão rápido com essas intensas agendas infantis. E decifrando, dia após dia, o enigma: o que fazer se faltam só cinco minutos para sair para a escola, ele não comeu nada do prato, tem ainda a salada e a fruta, os dentes pra escovar, chora porque quer pegar as cartas de Yu-Gi-Oh! que esperam por ele em cima do armário da sala e acaba de derramar o suco na roupa inteira? Vou tentando. Sou mãe. Como todas, querendo ser a melhor do mundo e sendo somente a melhor que eu poderia ser. Às vezes, um decibel a mais, uma dose de humor a menos, e um amor incomensurável. O importante é estar atenta e aproveitar essa gincana, essa aventura. Feliz Dia das Mães! 

(Denise Fraga - Crônica retirada do delicioso livro "Travessuras de mãe")

3 comentários:

  1. Simplesmente AMO as crônicas da Denise e como me identifico com muitas delas! Nos levam à reflexão de uma maneira divertida, espontânea, uma delícia!

    Educar realmente é uma árdua tarefa, complexa, sem fórmulas, por essas e outras que tem tanta gente parindo, porque parir é fácil, mas educar... Ser mãe, sem dúvida, é muito mais do que parir, muito mais!

    Achei especialmente emocionante a parte em que ela diz (e tão sabiamente): "Como todas, querendo ser a melhor do mundo e sendo somente a melhor que eu poderia ser". É exatamente isso! Feliz dia das mães pra cada uma de nós!

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  2. Muito bonita, bem escrita e verdadeira essa crônica. Ela retrata com exatidão situações que vivemos com nossos filhos, incluindo nossas dúvidas, certezas, aprendizagem. Ótima escolha, parabéns!

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    1. Obrigada, Zizi, eu sou suspeita pra falar, pois me amarro no estilo da Denise Fraga e amo esse livro dela! Quem sabe um dia ela não vem aqui nos dar um alô ou faz uma "orelha" do nosso livro, né? Sonhar não custa nada... kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

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