domingo, 31 de julho de 2016

Doces fraldas

Suspense. Abri a primeira fralda. Então é só isso? Não, Denise, isso é o mecônio, aquele cocozinho inicial do bebê. A variedade de tons amarelos e verdes ainda estava por vir, e com ela as ridículas tentativas de descrição para o pediatra ao telefone. "Não dá pra dizer que é verde. Também não é amarelo. Sabe a azeitona do vidro que você jura que tá passada? É aquela cor!" A cada abertura de fralda, uma avaliação se estava tudo certo com o seu bichinho. Se o seu leite, o ar de São Paulo, as condições climáticas, a Coca-Cola a que você não resistiu, a feijoada do sábado. Enfim, se tudo o que você oferecia para o seu bebê filtrar estava indo pelo caminho errado.

Fraldas, fraldas e mais fraldas. E depois do pequeno todo trocado, cheiroso e limpinho, meus dedos ainda brancos de Hipoglós, eu sentia na mão o quente borbulhar de um novo recomeço. Nosso pequeno Nino tinha uma cara especial para anunciar seu cocozinho. Seus lábios se esticavam para os lados num sorriso reto e engraçado de palhaço de circo. Tinha vontade de rir da cara dele e de chorar pela nova fralda a trocar.

Mais u menos cheirosas, as fraldas vão fazendo parte de nossa vida a ponto de esquecermos que um dia vamos ficar sem elas. Eu pensava: "Como é que faz? Como é que se tira a fralda?" Vinham dicas de tudo que era lado, afinal o que não falta é mãe de plantão. O pequeno andante não podia nem sequer dar uma passeadinha pelo banheiro que já era interpretado. "Quer xixi". E tira a fralda, e senta o pequeno, e espera, e o pequeno quer sair, e pega o pequeno, e senta de novo, e abre a torneira, e conta história, e desiste, e põe a fralda de novo, e passam-se dois minutos e você tem mais uma fralda pra trocar. No verão, a gente tira. Deixa o pequeno só de shortinho e prepara um bom estoque de sandálias porque vão molhar.

Confesso que, quando tirei a fralda dos meus filhos, deu um certo dó daquela responsabilidade que lhes era atribuída tão cedo. Eles não podiam usar fraldas até que quisessem fazer suas necessidades no banheiro, mas porque alguém falou que já estava na hora, que já estavam grandinhos demais para andar de fralda aos dois anos.

Tirar a fralda do dia até que foi fácil; a da noite, me lembro bem, senti muita vontade de chorar na madrugada.

Tudo começou com uma série de fraldas amanhecendo secas pela manhã. Está na hora, já pode dormir sem. Eba, que fácil! Foi a maior emoção quando escutamos pela primeira vez os passinhos no corredor, o abrir da porta do banheiro e o barulhinho do primeiro xixi noturno batendo na água. Pronto, ele não faz mais xixi na cama. Doce ilusão! À série de fraldas secas se seguiram inumeráveis lençóis molhados. Não põe a fralda de novo senão ele não aprende! Judiação, o carinha dormindo ter a responsabilidade de segurar um xixi. Cê fez xixi, filho? "Não sei, eu tava dormindo?!" Por que não é permitido dormir de fralda até cinco, seis anos?

Foram mutos chamados ("Mamãe") no meio da madrugada. O pequeno Nino não admitia dar um truque e tomar banho no dia seguinte. Houve uma fase de sonolentos banhos às três da manhã no delicioso inverno de São Paulo. Ninguém merece. Nem nós, nem eles. E ninguém merece ficar sem beber água depois das sete da noite. Mas confesso: a té hoje a água noturna é regulada aqui em casa, porque, vez por outra, ainda escapa um xixi. Fico pensando como minha mãe fazia, porque me lembro bem da sensação do quentinho subindo pelo lençol. E eu já devia ser bem grandinha. Mas ela não se lembra mais. E provavelmente eu também vou me esquecer dos tantos lençóis e pijamas trocados na madruga.

(Denise Fraga - Crônica extraída do livro "Travessuras de Mãe")

3 comentários:

  1. Adooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooro o jeito espontâneo e divertido da Denise Fraga e este aqui sobre desfraldar eu achei tão sensacional que tive que trazer pra cá, para compartilhar com vocês, abrindo assim o novo tema aqui do nosso blog! Espero que gostem!

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  2. Que lindo texto, Dequinha! A Denise escreve muito bem! Ela tem um jeito bem leve e espontâneo de registrar os fatos. Amei! ,

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    1. Também gosto muito! Este livro dela é sensacional, me amarro!

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